quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

O medo de amar é o medo de ser livre



Está tocando um disco de Elis. Um disco lindo, chamado Trem Azul. Na faixa 3, Elis canta "o medo de amar é o medo de ser livre para o que der e vier". E essa frase fica girando na minha cabeça sempre que escuto essa música. Resolvi me resolver nisso. Se é que isso é possível.
Ser livre para o que der e vier é correr o risco de pagar para ver, ainda que não existam garantias. Essas tais que buscamos em tudo que fazemos. Tentamos nos atar a qualquer sopro que assegure que vai dar certo.
Mas o que é dar certo, afinal?
Alguma dose de medo protege, redobra a atenção. Por isso a gente precisa ter medo de saltar de páraquedas, de fazer rapel, voar de asa delta... O medo que garante o frio na barriga precisa existir.
Mas aquele medo que paralisa, que impede, que trava as possibildades de correr o risco de ver se pode ser bom, esse medo sim é o medo de ser livre.
É o medo de amar.
Porque no amor, penso eu, a liberdade está implícita. No amor precisa haver possibilidade, no amor precisa haver palavra mansa, no amor precisa haver o desprendimento de ser quem se é e deixar que assim o seja também com o outro.
Sempre fico com a sensação de que as relações estão voláteis. Ou incorre-se no erro oposto que é estabelecer relações aprisionantes.
Em nenhum dos dois casos há amor. Em nenhum dos dois casos há o arriscar-se. Em nenhum dos dois casos há o pagar para ver. Na volatilidade não há entrega, permanência e verdade. No aprisionamento falta o fôlego, a criatividade e a graça de olhar o novo dia como novo. E assim, polarizadas, as relações morrem antes mesmo de começar. E nos extremos não há encontro.
Encontro existe quando há a escolha partilhada de seguir um caminho sem garantias, mas com a intuição de que é possível entregar-se com todos os riscos que isso implica.
Exatamente quando há amor envolvido há algo que impele a arriscar. Porque somente quando há amor, o preço do risco se paga, pelo amor em si. Sem que haja outra moeda necessária.
O amor, em sua acepção mais ampla, é a energia que nos liga à vida e nos confere a coragem necessária a cada dia. O medo de amar é, portanto, o medo de viver. E viver, em última análise, é ser livre.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Despretensiosamente...

Há muito, desdenho dos meus sentimentos, fazendo um esforço mental para me manter viva. Acontece que esforço mental cansa. E, sendo uma expressão do anseio de controlar a realidade, corrói esperanças e desvitaliza. O esforço mental impõe uma cegueira afetiva, que obtura a possibilidade de enxergar o
essencial.
Os sentimentos, ao contrário, dão norte e me resgatam de ficar à  margem da vida. E são meus sentimentos o meu lugar de descanso, pois ainda que doloridos, me colocam em movimento e me revigoram. Meus sentimentos são o ponto geográfico onde posso jogar minha âncora. Em mais nada posso me assegurar. Quando é possível se manifestar a partir do que se sente genuinamente, o gesto pode ser acolhido também pela sensibilidade daquele que o recebe.
Que coisa singela e desconcertante, ao mesmo tempo... Nos despimos das nossas defesas e nos dispomos a expor a nossa necessidade sem o medo do ataque. Singela pela simplicidade. Desconcertante porque é surpreendente ser quem se é.
Necessário é que se veja com os olhos do coração, dizem... E nada há de óbvio nisso. Se assim o fosse, não gastarí­amos extensos pedaços do nosso tempo em decifrar, ocultar, decodificar as circunstâncias, como se tudo fosse um jogo de estratégia bélica.
E estarí­amos descomplicadamente a viver o que surge, o que desponta e aparece, tal como uma criança.
E facilitarí­amos imensamente a nossa vida.